quinta-feira, 28 de junho de 2007

A Violência e o Pan

Quando tiver início o PAN 2007 aqui no Rio de Janeiro, eu espero que os
atletas brasileiros tenham a consciência de que quando eles estiverem no
alto do podium recebendo suas medalhas, sejam elas de ouro, prata ou
bronze, essas estarão todas manchadas com o sangue de pessoas inocentes que
estão sendo massacradas nos morros, favelas e periferias da Cidade
maravilhosa. Parece que o poder público, que mais se parece com um poder
paralelo, não ficou satisfeito apenas com o trabalho desenvolvido pelas
milícias, apoiadas por ele próprio, -- fato este denunciado pela
diretora-presidente do Instituto de Segurança Pública do Estado, Ana Paula
Miranda, numa entrevista concedida para a edição nº: 119 desta revista – e
resolveu usar o seu “direito” ao monopólio da violência com um desdém e um
descaso pela vida humana que impressiona pelo grau de crueldade.
A polícia tem feito incursões nos morros e favelas de modo irresponsável e
covarde, pois algumas dessas operações se iniciam por volta de 07:00 e
08:00hs da manhã. Até o mais imbecil, idiota e estúpido ser humano da face
da Terra sabe que este é o horário em que a maioria das pessoas estão
saindo, ou para trabalhar, ou para levar os seus filhos para a escola ou
creche. E quando alguém é atingido nessas trocas de tiro, vemos o
governador, o secretário de segurança, em suma, as autoridades
(in)competentes, dizer que a polícia fez o seu trabalho corretamente, e que
ela só reagiu porque foi recebida à tiros. Ora, quem tem a obrigação de zelar pela vida, a segurança e o bem-estar dos cidadãos é o poder
constituído do Estado, e não o marginal; caso contrário este não seria
marginal (aquele que está à margem da lei) e aquele não seria um poder
legitimamente constituído. Opa! Será que eu decifrei o enigma?!
Somente no dia 06 de maio, cerca de treze pessoas foram feridas à tiro (uma
delas de modo fatal) durante as operações da polícia, e, pasmem, não havia
nenhum bandido entre as vítimas.O governador Sérgio Cabral declarou,
durante uma entrevista à imprensa, que lamentava o ocorrido mas que não
iria parar com essas ofensivas, pois não há outra maneira de se combater
esses criminosos. Provavelmente, para o governador, a polícia só deve
utilizar a inteligência quando os criminosos forem desembargadores, juízes,
políticos, bicheiros, empresários, etc. . Apenas gostaria de informar ao
governador, que nos morros e favelas não há indústria bélica, plantação de
maconha ou produção de cocaína. Inclusive esta última tem, no éter, o seu
principal produto para se obter o refino da coca, e eu não me lembro de
ninguém que tenha pensado em exigir das indústrias farmacêuticas um
controle rígido para a venda dessa substância. É por essas e outras que eu
não posso deixar de lembrar do velho Marx quando este dizia já em 1847, no
Manifesto do Partido Comunista, que o Estado nada mais é do que um comitê
da burguesia, para satisfazer seus interesses econômicos, políticos e
sociais, e assim, manter-se como classe dominante.
Esses movimentos e ONGs que se dizem “pela paz”, “da paz”, “contra a
violência”, etc., ao invés de ficarem plantando rosas e colocando cruzes
nas areias de Copacabana para contar os mortos, deveriam se juntar e propôr
aos atletas e a população de um modo geral um verdadeiro boicote ao PAN
2007 e a tudo que se relacione com este evento. O seu custo financeiro
(cerca de 2 bilhões de reais) bancado pelos cofres públicos, e,
principalmente, o seu custo em vidas humanas – e não se trata só de mortos e feridos à bala, mas também de despejos de comunidades inteiras que moram
à cerca de 20 à 30 anos no mesmo local, e que estão sendo retiradas de suas
casas para melhorar o “visual” turístico do Rio – me parecem caros demais,
independentemente de qual fosse o motivo. Como dizia o saudoso Dr. José
Róiz numa frase que virou título de seu livro: “O esporte mata!”. E como
mata!

Renato Prata Biar é historiador. pratabiar@ yahoo.com. br
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